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Menopausa: especialistas atestam benefício e segurança da reposição hormonal

Entre tabus históricos e receios atuais, uso de hormônios - respaldado em evidências - pode ser grande aliado para viver essa fase com mais qualidade de vida

Por Victória Ribeiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 29 ago 2025, 14h52 - Publicado em 29 ago 2025, 06h00

Poucas experiências de vida da mulher suscitaram, ao longo da história, tantos tabus e temores como o climatério — o período que engloba o fim da produção dos hormônios femininos e as cenas que se seguem depois da última menstruação. O tema ora era tratado como nota de rodapé nos manuais de anatomia, ora com uma aura de misticismo. Se o grego Hipócrates, o pai da medicina ocidental, já o descrevia como o “envelhecimento do útero”, foi apenas no século XIX que se criou um retrato mais consolidado da mulher nessa fase. E ele era nada lisonjeiro. Quem enfrentava a menopausa — um termo que, a rigor, designa a janela de doze meses consecutivos sem menstruar — era tachada de instável ou até doente. Décadas de descobertas científicas e movimentos sociais culminam agora em uma autêntica revolução. De um lado, os especialistas entendem o que pode tornar mais branda e saudável essa passagem, com indicações consolidadas da reposição hormonal. Do outro, as mulheres jogaram a menopausa no ventilador, debatendo abertamente — e com seriedade e alguma dose de humor — seus desafios e conquistas. O assunto subiu ao palco, literalmente, como prova a peça em cartaz Cenas da Menopausa, com Cláudia Raia, de 58 anos.

arte reposição hormonal

Essa mudança na forma de encarar o climatério passa por retirar o peso físico e emocional atribuído a um processo que é natural, inevitável e, embora possa gerar sintomas e sofrimento, é passível de ser contornado com o apoio de recursos médicos. Ninguém há de negar que a menopausa provoca dissabores: ondas de calor, insônia, alterações de humor, lapsos de memória e ressecamento vaginal são alguns deles. Mas, com a indicação médica criteriosa, essas manifestações da queda dos hormônios podem ser estancadas. A principal estratégia para reaver a qualidade de vida e resguardar o organismo feminino é a reposição hormonal. Ocorre que, por falta de informação, ainda hoje ela é vista com receio por pacientes e até médicos. No entanto, na esteira dos últimos consensos das associações de ginecologia e de um recente posicionamento claro a favor da reposição feito pela agência reguladora americana, a Food and Drug Administration (FDA), é possível atestar que o método é seguro e vantajoso em boa parte dos casos.

Essa visão ajuda a reescrever uma narrativa sobre a menopausa cujas raízes remontam a meados do século XX. Em 1966, o médico americano Robert Wilson escreveu um best-seller que apresentava essa fase da vida não como uma etapa natural, mas como uma síndrome que devia ser tratada. Para ele, sem a reposição de hormônios, as mulheres estariam condenadas ao envelhecimento precoce, à perda da feminilidade e até à reclusão social. O tom categórico, embora tenha jogado luz sobre a questão, consolidou no imaginário a noção de que o climatério era uma ameaça às mulheres e as pessoas ao seu redor (em especial, os homens). Mas os tempos mudaram. Aos poucos, a menopausa deixou de ser encarada como o fim de um ciclo e passou a ser o início de outro. A reposição hormonal, por sua vez, é compreendida como uma ferramenta não só para manter o corpo e a mente em bem-estar, mas também reconquistar a autonomia e o protagonismo — especialmente em um mundo em que muitas mulheres estão no ápice da carreira nesse período. O ponto é que, apesar de o tema estar em alta, o medo da terapia hormonal ainda ecoa. Parte dele vem do legado de um estudo, o Women’s Health Initiative, publicado em 2002, que associou o tratamento combinado de estrogênio e progesterona ao aumento de casos de câncer de mama. A partir daí, mesmo com ponderações dos experts, a controvérsia se instalou, levando à queda nas prescrições. O problema, como ressaltaram pesquisadores em painel convocado pela FDA em julho deste ano, foi a interpretação equivocada do estudo: a idade média das mulheres que iniciaram a terapia no experimento era de 63 anos, considerada tardia para avaliar a segurança da reposição. Embora interesses da indústria também estivessem em jogo na recente reunião americana — defendeu-se a remoção das tarjas pretas das bulas, por exemplo —, a sensação é de que vem se consolidando um novo capítulo na história da menopausa.

BOA ALTERNATIVA - Reposição com adesivo: uma das formas do tratamento
BOA ALTERNATIVA - Reposição com adesivo: uma das formas do tratamento (MStudioImages/Getty Images)
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Não é que a terapia hormonal seja panaceia, claro. Há indicações e contraindicações a pesar. E o tempo, como apontou a FDA, é fator importante. “Com o avanço das pesquisas, hoje sabemos que o momento ideal para iniciar o tratamento é durante a transição menopausal, o climatério, ou até dez anos após a última menstruação”, diz Celeste Wender, presidente da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia. Segundo a médica, respeitar essa janela não significa apenas a redução de riscos e o alívio de sintomas típicos, mas também benefícios claros à saúde, como prevenção da osteoporose, prevenção do diabetes, alívio de dores articulares e maior hidratação da pele e mucosas. Só que, além do “quando”, o “como” também faz diferença nesse contexto.

Na reposição hormonal clássica, o estrogênio natural responde pela maior parte dos efeitos bem-vindos. E a progesterona ou os progestogênios entram em cena em mulheres com útero, para proteger o endométrio. A via de administração também importa. Grande parte das polêmicas sobre o estudo de 2002 está ligada ao uso de estrogênio em cápsulas. “Só que esse hormônio, por via oral, pode elevar o risco de trombose”, afirma Wender. Hoje, há alternativas como adesivos, géis ou sprays transdérmicos. Dependendo da presença de fatores de risco, como os cardiovasculares, elas são consideradas opções mais seguras. Em resumo: com a devida orientação, é possível afinar a orquestra, sem impor ruídos. Quando isso acontece, até o coração das mulheres sem contraindicações sai ganhando. O cardiologista Otavio Gebara, que estuda a relação entre coração e reposição hormonal desde a década de 1990, explica que o estrogênio natural ajuda a controlar o colesterol. “Em um estudo com reposição hormonal transdérmica, observamos efeito positivo até na hipertensão”, diz o médico.

CONTRAINDICAÇÃO - Histórico de câncer de mama: hormônios não são opção
CONTRAINDICAÇÃO - Histórico de câncer de mama: hormônios não são opção (Manassanant pamaim/Getty Images)
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Mas, como nem tudo são flores, existem situações para as quais a terapia deve ser evitada. Nesse caso, invertendo a lógica, os hormônios podem alimentar um problema sério, caso do próprio câncer de mama, independentemente de histórico familiar da doença. “É o que chamamos de risco relativo, e não absoluto”, afirma a mastologista Fabiana Makdissi, do A.C. Camargo Cancer Center, de São Paulo. Na prática, isso quer dizer que quem usa hormônio por pouco tempo, até cinco anos, tem um risco parecido com o da população em geral. E ele vai aumentando quanto maior o tempo de uso, mas sempre dentro de um cenário complexo: outros fatores também influenciam o surgimento de um tumor, como obesidade e sedentarismo. E, se a reposição pode, de certa forma, oferecer benefícios como mais disposição, estimulando a prática de exercícios e conferindo melhor qualidade ao sono, essas vantagens devem ser ponderadas antes da decisão. “A reposição tem contraindicação absoluta apenas a mulheres que já tiveram câncer de mama. Nos demais casos, a indicação deve ser fruto de uma decisão compartilhada, considerando as necessidades da paciente e a opinião dos médicos”, orienta Makdissi.

Hoje, contudo, um dos maiores transtornos apontados pelos especialistas é a distorção do conceito de reposição hormonal. Profissionais que se intitulam expoentes da hormonologia (uma área que sequer é chancelada) ou da medicina antienvelhecimento, inspirados mais por interesses comerciais do que por provas científicas, têm receitado indiscriminadamente implantes hormonais. Na fórmula entram uma série de substâncias, incluindo os anabolizantes esteroides como testosterona ou gestrinona, geralmente embalados como “chips da beleza” e prometendo músculos, libido, e por aí vai. Nesses casos, o perigo está à espreita. “Já tive pacientes com diagnóstico de câncer de mama que estavam usando esses implantes, que às vezes nem podem ser retirados depois de colocados”, relata Makdissi.

CAUSA EM ALTA - Fernanda Lima: uma das celebridades que tocam no assunto
CAUSA EM ALTA - Fernanda Lima: uma das celebridades que tocam no assunto (@fernandalima/Instagram)
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No fim das contas, não se trata de demonizar nem de santificar os hormônios. Eles são, sim, um recurso poderoso, mas não o único para atravessar a menopausa de forma mais tranquila. Exercícios físicos, alimentação balanceada, boas noites de sono, controle do estresse e outros cuidados com a saúde entram no pacote para quem quer apaziguar sintomas e desafios nesse período. Outro ingrediente fundamental é a própria abertura e conversa franca sobre o climatério. E não apenas entre as quatro paredes de casa ou do consultório.

Nessa direção, a sociedade tem evoluído bastante nos últimos anos. Uma das celebridades que se tornou “influenciadora” da causa é a apresentadora e modelo Fernanda Lima, de 48 anos. Ela toca nas feridas dessa fase sem deixar de louvar os momentos únicos que propicia, porque a vida segue. Claudia Raia, por sua vez, com o espetáculo Cenas da Menopausa, traz de forma sensível e bem-humorada as experiências da mulher que encara o “luto ovariano”. Para a atriz, a peça vai muito além do palco: é um gesto necessário de desmistificação. Ela mesma admite ter demorado a compreender as mudanças típicas do período. Mais que entretenimento, a montagem atua como bússola para mulheres que se sentem desorientadas nesse processo — sensação comum e ainda marcada pelo peso do estigma histórico, como se o relógio biológico impusesse uma espécie de prazo de validade para a beleza e a vitalidade. No fundo, com o apoio da arte e da ciência, compreender o próprio corpo continua sendo a fórmula mais segura e eficaz de se cuidar.

Publicado em VEJA de 29 de agosto de 2025, edição nº 2959

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