Mortalidade por câncer supera doenças cardíacas em 727 municípios brasileiros
Estudo conduzido pela Unifesp mostra que houve uma transição nas causas de morte em diversas regiões do Brasil entre 2000 e 2019
Um estudo conduzido pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) mostrou que, em 727 municípios brasileiros, as mortes por câncer ultrapassaram as por doenças cardiovasculares até 2019. A pesquisa, publicada na revista científica Lancet Regional Health – Americas, revelou uma mudança significativa nas causas de mortalidade no Brasil ao longo das últimas duas décadas. Enquanto apenas 366 municípios (7% do total) registravam o câncer como a principal causa de morte no ano 2000, o número subiu para 727 municípios (13%) em 2019, o que representa um aumento de quase 100%.
Foram analisados dados de mortalidade de todos os municípios brasileiros entre os anos 2000 e 2019, identificando que essa transição não ocorreu de maneira uniforme em todo o país. O avanço no controle das doenças cardiovasculares, resultado de melhorias nos tratamentos e políticas de prevenção, foi mais expressivo nas regiões com maior desenvolvimento econômico, enquanto o câncer emergiu como a principal causa de morte em municípios com maior renda per capita.
Mudança no perfil de mortalidade
Historicamente, as doenças cardiovasculares foram a principal causa de morte no Brasil, mas o estudo mostrou que, com o passar dos anos, o câncer tem ganhado destaque. Essa mudança pode ser explicada por diversos fatores, incluindo o envelhecimento populacional, o aumento da exposição a fatores de risco como o tabagismo, consumo de álcool, obesidade, sedentarismo e dietas inadequadas.
Outro ponto importante levantado pelo estudo é que, enquanto as políticas de prevenção e tratamento de doenças cardíacas resultaram em uma queda acentuada na mortalidade por essas causas, o mesmo não aconteceu com o câncer.
“Os resultados indicam uma transição epidemiológica no Brasil, onde os avanços no tratamento e prevenção das doenças cardiovasculares trouxeram uma redução na mortalidade por essas causas, mas o câncer tem crescido como uma das maiores ameaças à saúde pública“, explica Leandro Rezende, coordenador do estudo e professor do Departamento de Medicina Preventiva da Unifesp.
Aumento desigual nas regiões do Brasil
O estudo também revelou disparidades regionais significativas. Enquanto as regiões mais ricas, como o Sudeste e o Sul, registraram uma redução mais expressiva nas mortes por doenças cardiovasculares, o câncer avançou rapidamente nessas áreas, algo relacionado ao melhor acesso ao diagnóstico e tratamento da doença.
Em contraste, nas regiões Norte e Nordeste, onde o desenvolvimento econômico é menor, tanto o câncer quanto as doenças cardiovasculares continuam a ser grandes desafios, muitas vezes agravados pela falta de infraestrutura de saúde e de programas eficazes de prevenção.
Novas estratégias para a saúde pública
Diante desses dados, a pesquisa reforça a necessidade de reformulação das políticas de saúde pública no Brasil, para atender à crescente demanda por estratégias voltadas ao controle e prevenção do câncer.
“Essas desigualdades regionais reforçam a necessidade de políticas públicas que levem em consideração as especificidades de cada região, especialmente nas áreas com infraestrutura de saúde mais limitada”, destaca Rezende. “É de extrema importância que o governo invista em campanhas de prevenção ao câncer que alcancem todas as camadas da população, além de garantir o acesso universal ao diagnóstico precoce e ao tratamento adequado”, finaliza o pesquisador.
O estudo ressalta que, embora as campanhas voltadas à prevenção de doenças cardiovasculares tenham demonstrado sucesso, o mesmo esforço precisa ser replicado para combater o câncer. Isso inclui iniciativas que incentivem hábitos de vida saudáveis e a redução da exposição a fatores de risco, além de garantir que o acesso ao diagnóstico precoce e ao tratamento adequado sejam universalizados, diminuindo assim o impacto dessa doença, que já é a principal causa de morte em diversas partes do Brasil.