A mais robusta pesquisa realizada até agora sobre o uso da hidroxicloroquina em pacientes adultos não hospitalizados com formas leves ou moderadas de Covid-19 demonstrou que o remédio não promove qualquer benefício e, portanto, não deve ser prescrito a indivíduos nessas condições. O estudo acaba de ser publicado no periódico científico The Lancet Regional Health – Americas, um dos mais respeitados do mundo, e foi conduzido pela Coalizão Covid-19 Brasil, aliança formada pelo Hospital Alemão Oswaldo Cruz, Hospital Israelita Albert Einstein, HCor, Hospital Sírio-Libanês, Hospital Moinhos de Vento, BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo, o Brazilian Clinical Research Institute (BCRI) e Rede Brasileira de Pesquisa em Terapia Intensiva (BRICNet). Trata-se de uma iniciativa inédita que reúne pesquisadores de diferentes instituições brasileiras com o objetivo de avaliar a eficácia e a segurança de potenciais terapias contra a enfermidade provocada pelo coronavírus.
Os resultados agora divulgados são do estudo Coalizão V, que teve o apoio da farmacêutica EMS por meio do fornecimento dos medicamentos. O objetivo era descobrir se a hidroxicloroquina teria algum benefício no tratamento da Covid-19 quando ministrada a pacientes com graus leve ou moderado de sintomas e que não haviam necessitado de internação. Outros trabalhos tinham demonstrado a ineficácia do remédio em casos graves, com pacientes internados. “Faltava saber seu impacto no grupo de pacientes com sintomas mais leves e que estavam em casa”, explicou o cardiologista Renato Lopes, professor de Medicina da Duke University, nos Estados Unidos, e membro do comitê executivo do Coalizão Covid-19 Brasil.
Entre maio de 2020 e julho de 2021, foram acompanhados 1.372 pacientes registrados por 56 centros de pesquisa brasileiros. O estudo avaliou o uso de hidroxicloroquina em comparação com placebo por meio de randomização (sorteio) de pacientes com até sete dias do início dos sintomas. Cada um apresentava ao menos uma comorbidade associada ao agravamento da doença, como obesidade e diabetes. A dose avaliada foi de 400 mg 12/12h no primeiro dia, seguido de 400 mg/dia durante o período total de sete dias.
Os cientistas queriam saber se o regime medicamentoso reduziria as taxas de hospitalizações por causa da Covid-19 em até trinta dias após o início do estudo. A conclusão foi de que não houve diferença significativa no total de internações entre quem recebeu remédio ou placebo (6,4% e 8,3%, respectivamente). Também não houve diferença importante nas taxas de óbito e de ocorrência de eventos adversos graves.
A avaliação foi complementada por uma meta-análise com todos os estudos previamente publicados que investigaram o mesmo ponto. Entre eles, o estudo COPE, que também mostrara ausência de benefício.
As conclusões dos pesquisadores brasileiros são a pá de cal que faltava para excluir de vez a hidroxicloroquina como opção contra a Covid-19. “A ciência mostra que ela não funciona. Temos que acreditar no que comprovam os estudos científicos e não em achismos”, reforça o médico Renato Lopes.
Ivermectina
Os resultados vêm dois dias depois da divulgação de outro estudo, com participação brasileira e publicado em mais um periódico científico de primeira grandeza, o The New England Journal Of Medicine, demonstrar cabalmente a ineficácia da ivermectina na redução da taxa de hospitalização por Covid-19. Assim como a hidroxicloroquina, o antiparasitário fazia parte das indicações do governo de Jair Bolsonaro contra a doença.
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