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O mais novo fator de risco para o Alzheimer está no ar que você respira

Partículas de poluição podem danificar saúde cerebral, sugere estudo divulgado no The Lancet; cidades como São Paulo e Guarulhos estão acima dos níveis de risco

Por Victória Ribeiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 29 jul 2025, 10h57

A maior revisão já realizada sobre a relação entre poluição do ar e demência confirma o que estudos anteriores já vinham apontando: o ar que respiramos pode ter um papel importante no desenvolvimento de doenças neurodegenerativas, como Alzheimer e demência vascular.

Publicado na The Lancet Planetary Health, o estudo analisou dados de mais de 26 milhões de pessoas ao redor do mundo. A conclusão foi foi de que a exposição prolongada a poluentes como partículas finas (PM2,5), dióxido de nitrogênio (NO₂) e fuligem (black carbon) pode afetar diretamente a saúde do cérebro.

Os poluentes que mais preocupam

Entre todos os compostos analisados, três se destacaram pela associação estatisticamente significativa com o aumento do risco de demência:

PM2,5: são partículas minúsculas, pequenas o suficiente para serem inaladas. Elas vêm de várias fontes, como escapamento de veículos, usinas, atividades industriais, fogões a lenha, queima de biomassa e poeira da construção civil, e também se formam na atmosfera a partir de reações químicas com outros poluentes. Por serem tão leves, podem permanecer no ar por muito tempo e se espalhar por longas distâncias.

NO₂: resultado da queima de combustíveis fósseis, está presente especialmente em áreas com trânsito intenso. É liberado por motores a diesel, emissões industriais e até por fogões e aquecedores a gás. Em altas concentrações, também pode irritar as vias respiratórias e agravar doenças como asma.

Fuligem: derivada da queima incompleta de combustíveis fósseis e biomassa, como madeira. Além de reter calor e impactar o clima, quando inalada pode atingir os pulmões e entrar na corrente sanguínea, aumentando o risco de doenças respiratórias e cardiovasculares.

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Segundo os pesquisadores, a cada aumento de 5 microgramas por metro cúbico (μg/m³) de PM2,5, o risco de demência sobe 8%. No caso do NO₂, o aumento é de 3% a cada 10 μg/m³. Para o carbono negro, o risco é 13% maior a cada 1 μg/m³ adicional.

Apesar de parecerem pequenos, esses percentuais ganham peso quando aplicados a populações inteiras, especialmente em regiões com altos níveis de poluição. Para ter ideia, segundo um estudo divulgado em 2024 pelo Ministério da Saúde em parceria com o Ministério do Meio Ambiente, a média anual de PM2,5 no Brasil em 2023 foi de 9,9 μg/m³, quase o dobro do limite de 5 μg/m³ recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Isso, pelas estimativas dos pesquisadores internacionais, significaria cerca de 8% a 10% de aumento no risco de demência para a população brasileira, em média, apenas para esse composto, desconsiderando os outros.

Em grandes centros urbanos, o cenário é pior. Na cidade de São Paulo, a média anual chegou a 14,59 μg/m³. Com base no estudo, isso representaria um aumento de aproximadamente 20% no risco de demência em relação a populações expostas ao padrão ideal da OMS. E há locais com níveis muito acima disso: algumas regiões da capital paulista registraram 36,5 μg/m³ e Guarulhos, 34,16 μg/m³. Esses valores, segundo as estimativas, poderiam estar associados a um risco quase 55% maior de demência, considerando exclusivamente a exposição ao PM2,5.

Evidência sólida, ainda que moderada

A revisão reuniu 51 estudos realizados em diferentes continentes, com metodologias diversas para medir a exposição à poluição e diagnosticar demência. Embora existam diferenças entre cada um deles, os resultados se mostraram alinhados e consistentes para PM2,5, NO₂ e fuligem.

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Outros poluentes, como ozônio (O₃), partículas maiores (PM10) e óxidos totais de nitrogênio (NOx), não mostraram associações estatisticamente significativas. Ainda assim, os autores ressaltam que há poucos estudos sobre esses compostos e que são necessários mais dados para conclusões mais precisas.

A qualidade dos estudos analisados também foi avaliada. Apenas três apresentaram alto risco de viés. Os demais foram classificados com risco baixo ou provavelmente baixo. A confiança geral nas evidências foi considerada moderada, o que, na linguagem científica, já é suficiente para embasar recomendações de políticas públicas.

“Esses resultados reforçam e ampliam as evidências de que a poluição do ar é um fator de risco para demência”, afirmam os autores, da Universidade de Cambridge. “Reduzir a exposição da população a esses poluentes poderia diminuir a incidência da doença e trazer benefícios significativos para a saúde, a sociedade e a economia.”

Como a poluição afeta o cérebro?

Ainda não se sabe exatamente como os poluentes afetam o sistema nervoso central, mas estudos com humanos e animais já apontam alguns caminhos. As partículas ultrafinas podem alcançar o cérebro tanto diretamente, pelo nervo olfativo, quanto indiretamente, via corrente sanguínea.

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Uma vez lá, podem desencadear inflamações, estresse oxidativo e danos na barreira hematoencefálica, que protege o cérebro de substâncias nocivas. Esses processos estão associados à morte de neurônios e ao acúmulo de proteínas tóxicas, como a beta-amiloide, presente na doença de Alzheimer.

“Há um corpo crescente de evidências que apoia a plausibilidade biológica dessa associação”, escrevem os autores. “Tanto mecanismos diretos quanto respostas inflamatórias sistêmicas podem estar envolvidos.”

Demência vascular ou alzheimer?

Na análise por subtipo da doença, a associação entre poluição e demência foi mais forte nos casos classificados como demência vascular (um tipo causado por alterações nos vasos sanguíneos do cérebro, como pequenos infartos) do que na doença de Alzheimer. A diferença não foi estatisticamente significativa, mas reforça a hipótese de que a poluição possa prejudicar a saúde vascular cerebral.

Vale lembrar que muitos casos envolvem formas mistas da doença e que os métodos diagnósticos variam bastante entre os estudos, o que limita análises mais detalhadas.

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Outro ponto importante é a representatividade das pesquisas. A maioria dos estudos foi conduzida em países de alta renda, com populações predominantemente brancas. Ainda são escassos os dados sobre o impacto da poluição em grupos mais vulneráveis, como populações indígenas, periféricas e residentes de países de baixa e média renda, onde a poluição tende a ser mais intensa.

“Essas lacunas limitam a generalização dos resultados e sugerem que o impacto da poluição pode ser ainda maior em populações historicamente mais expostas”, alertam os pesquisadores.

Fator de risco

A OMS já havia reconhecido a poluição do ar como fator de risco para doenças neurodegenerativas. Agora, diante dos resultados, os pesquisadores acreditam que os indícios estão ainda mais fortes de que a poluição do ar deve ser tratada como um fator de risco modificável, ou seja, algo tão relevante quanto os fatores de risco já conhecidos, como idade avançada, hipertensão e diabetes, e que pode ser prevenido com mudanças políticas e sociais.

“Esforços para reduzir a exposição a esses poluentes essenciais provavelmente ajudarão a reduzir o impacto da demência na sociedade. Limites mais rigorosos para diversos poluentes provavelmente serão necessários, visando os principais contribuintes, como os setores de transporte e indústria”, defendeu a coautora principal do estudo, Clare Rogowski, da Unidade de Epidemiologia do Conselho de Pesquisa Médica (MRC) da Universidade de Cambridge.

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Para a autora líder, a epidemiologista Haneen Khreis, medidas para reduzir a poluição do ar podem trazer benefícios a longo prazo não só para a saúde do cérebro e o clima, mas também para a economia, ao reduzir a pressão sobre os sistemas de saúde.

Segundo os autores, os resultados já são suficientes para orientar:

  • Revisão de limites de qualidade do ar, com base em riscos neurológicos e não apenas respiratórios.
  • Campanhas de saúde pública, informando sobre os efeitos da poluição além dos pulmões.
  • Planejamento urbano mais sustentável, com incentivos ao transporte limpo, ampliação de áreas verdes e restrição ao tráfego em zonas densamente habitadas.
  • Monitoramento ambiental mais robusto, com dados atualizados e acessíveis à população e aos pesquisadores.
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