A Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou uma atualização significativa de sua lista de patógenos prioritários, destacando bactérias resistentes a antibióticos que representam uma ameaça crescente para a saúde global. Esta lista, inicialmente publicada em 2017, serve como uma ferramenta crucial para orientar investimentos em pesquisa e desenvolvimento de novos tratamentos, além de estratégias para combater a resistência antimicrobiana.
A lista classifica 24 bactérias em 15 famílias de patógenos resistentes a antibióticos em três grupos de prioridade: crítica, alta e média (veja abaixo). Esta categorização é baseada na gravidade da ameaça que cada patógeno representa e na urgência para desenvolver novas opções de tratamento. O objetivo é identificar as bactérias que necessitam de intervenção urgente e direcionar recursos para enfrentar esses desafios.
A atualização da OMS reflete melhorias recentes na vigilância, incluindo em locais com recursos limitados, e incorpora as primeiras estimativas sobre o impacto global da resistência aos antibióticos. No entanto, o desafio representado por essas bactérias vai além das estatísticas. A resistência antimicrobiana pode agravar a situação das infecções, tornando o controle de surtos infecciosos mais difícil e comprometendo os esforços de saúde pública para prevenir a disseminação de doenças que podem levar a pandemias.
Impacto global da resistência antimicrobiana
De acordo com uma série de artigos publicados na revista científica The Lancet, todos os anos, cerca de 7,7 milhões de mortes são atribuídas a infecções bacterianas, das quais 4,95 milhões estão associadas a patógenos resistentes a medicamentos. Neste montante, 1,27 milhão de mortes são diretamente causadas por bactérias resistentes aos antibióticos disponíveis.
O problema tem relação com a alta carga geral de infecções bacterianas, algo agravado pelo fato de que a resistência antimicrobiana é um sintoma das desigualdades globais de saúde, quadro que não podem ser resolvido em uma agenda focada em países de alta renda. Por isso, o problema continua a crescer, impulsionado ainda pelo uso inadequado de antimicrobianos e pela falta de acesso a medicamentos essenciais.
Segundo a OMS, sem ação urgente, o número de mortes associadas à resistência antimicrobiana aumentará para 10 milhões por ano até 2050, aumentando os custos globais de saúde em até US$ 1 trilhão por ano e custando à economia mundial US$ 100 trilhões até 2050.
O problema afeta todas as idades e regiões, desde hospitais a áreas residenciais, e até mesmo animais e cadeias alimentares. Especialmente em áreas com recursos limitados, onde o acesso a antibióticos eficazes é restrito, a situação se agrava. Crianças, idosos e gravemente doentes são particularmente vulneráveis a infecções resistentes.
Patógenos de prioridade crítica
O grupo de prioridade crítica inclui bactérias que são resistentes aos antibióticos de última linha, usados quando outros tratamentos falham. Esses patógenos são responsáveis por infecções graves e muitas vezes difíceis de tratar. Entre eles estão:
- Acinetobacter baumannii, resistente a carbapenem: Este patógeno é uma preocupação importante em ambientes hospitalares, onde pode causar infecções graves, como pneumonia e infecções na corrente sanguínea, especialmente em pacientes com sistemas imunológicos comprometidos
- Enterobacterales, resistente a cefalosporinas de terceira geração: Este grupo inclui bactérias como Klebsiella pneumoniae e Escherichia coli, que podem provocar infecções graves e difíceis de tratar, devido à sua resistência a uma classe crítica de antibióticos
- Enterobacterales, resistente a carbapenem: Também conhecido como “superbactérias”, esses micróbios apresentam resistência a uma das últimas linhas de defesa em antibióticos, o que torna o tratamento de infecções provocadas por eles extremamente desafiador
- Mycobacterium tuberculosis, resistente a rifampicina: Essa forma resistente da bactéria causadora da tuberculose é um desafio significativo, especialmente em países de baixa renda, onde a doença é mais prevalente e o tratamento pode ser limitado
Patógenos de alta prioridade
Os patógenos de alta prioridade têm um impacto significativo na saúde pública e são especialmente preocupantes em comunidades e ambientes de cuidados de saúde. Incluem:
- Salmonella Typhi, resistente a fluoroquinolonas: Causa febre tifoide e é resistente a uma classe importante de antibióticos, tornando o tratamento e controle das infecções mais difíceis
- Shigella spp., resistente a fluoroquinolonas: Responsável por diarreia severa, esta bactéria desenvolveu resistência a antibióticos usados comumente para tratar infecções intestinais
- Enterococcus faecium, resistente a vancomicina: Este micróbio pode causar infecções graves, como infecções urinárias e na corrente sanguínea, e a resistência à vancomicina limita as opções de tratamento
- Pseudomonas aeruginosa, resistente a carbapenem: Além de sua resistência a múltiplos antibióticos, essa bactéria pode causar infecções severas em pacientes com condições crônicas ou imunocomprometidos
- Salmonella não-tífica, resistente a fluoroquinolonas: Assim como outras espécies de Salmonella, esta pode causar doenças intestinais graves e é resistente a importantes antibióticos
- Neisseria gonorrhoeae, resistente a cefalosporinas de terceira geração e/ou fluoroquinolonas: Esta bactéria causa gonorreia e tem desenvolvido resistência a tratamentos comuns, complicando a gestão da doença
- Staphylococcus aureus, resistente a meticilina: Conhecida como MRSA, esta bactéria pode causar uma variedade de infecções, incluindo infecções de pele e de corrente sanguínea, e é resistente a muitos antibióticos usados para tratá-la
Patógenos de prioridade média
Os patógenos de prioridade média afetam desproporcionalmente populações vulneráveis, como crianças e idosos. Estes incluem:
- Streptococcus pyogenes (grupo A), resistente a macrolídeos: Esta bactéria é responsável por infecções como faringite estreptocócica e pode ser difícil de tratar quando resiste aos macrolídeos
- Streptococcus pneumoniae, resistente a macrolídeos: Causa pneumonia e outras infecções respiratórias, e a resistência aos macrolídeos reduz as opções de tratamento eficazes
- Haemophilus influenzae, resistente a ampicilina: Pode causar infecções respiratórias e meningite, e a resistência à ampicilina compromete a eficácia do tratamento
- Streptococcus agalactiae (grupo B), resistente a penicilina: Este patógeno pode causar infecções graves em recém-nascidos e mulheres grávidas, e a resistência à penicilina limita as opções de tratamento