Os homens e as mulheres que estiveram na linha de frente do combate à pandemia da Covid-19 viveram uma das mais dramáticas realidades na história das suas profissões. Tendo à frente uma doença com imensa capacidade de contágio e que se manteve desconhecida nos meses iniciais do surto, eles se doaram e se arriscaram. A conta foi alta. No Brasil, estima-se que pelo menos um em cada dez profissionais de jaleco, incluindo enfermeiras e enfermeiros, tenha se contaminado. Na Espanha, houve 20% de contaminação entre profissionais de branco. Na Itália, 15%. O mau uso de equipamentos de proteção individual (EPIs) da parte de muitos deles foi um dos pontos decisivos — em muitos casos, a vestimenta era inadequada.
Alheios ao medo, por humanismo, quebraram protocolos para salvar vidas. As medidas incluíram atos singelos, como o uso dos próprios tablets e celulares para que os internados, sobretudo em hospitais públicos, pudessem se comunicar com familiares. Enfermeiras de rostos escondidos por dispositivos de proteção levavam crachás com fotos de seus sorrisos pendurados nos aventais, para serem identificadas pelos enfermos. Houve ações extremamente complexas que definiriam os caminhos no tratamento da infecção. O maior exemplo foi o que ocorreu no Hospital Albert Einstein, em São Paulo, onde houve o primeiro diagnóstico da doença no país, em 26 de fevereiro. A instituição pautou a medicina brasileira ao criar, ainda no início de março, um grupo de “gestão de crise”, uma espécie de sala de guerra. Das fervilhantes reuniões saíram diversas condutas médicas para tratar a então estranha Covid-19. O infectologista Moacyr Silva Junior (foto abaixo) fez da UTI do hospital sua casa, de domingo a domingo. No futuro, quando 2020 tiver virado história, haverá sempre emoção ao lembrarmos dos prolongados aplausos de louvação destinados aos bravos heróis de nosso tempo.
Publicado em VEJA de 30 de dezembro de 2020, edição nº 2719