Os melhores e os piores hábitos para os seus dentes, segundo especialistas
Com tantos produtos e promessas, dentistas explicam o que é mito e o que funciona de verdade para cuidar da saúde bucal

Cuidar da saúde bucal pode parecer complicado, principalmente diante de tantas opções nas prateleiras das farmácias ou nas telas das redes sociais. Mas, segundo especialistas, o segredo não está em técnicas mirabolantes ou produtos caros: a boa e velha rotina diária, feita do jeito certo, continua sendo o caminho mais seguro e eficiente para dentes e gengivas saudáveis.
“O que causa as doenças orais como a cárie e os problemas gengivais é a placa bacteriana, o chamado biofilme oral. Se essa placa for desorganizada todos os dias, com escovação e higiene adequada, já estamos fazendo o principal”, explica o dentista Hugo Lewgoy, especialista em cirurgia e traumatologia buco-maxilo-facial.
A escovação, por sua vez, deve ser feita ao menos duas vezes ao dia, preferencialmente após as refeições, com atenção especial à higiene noturna. “Durante o sono, a produção de saliva diminui, o que altera o pH da boca e favorece a proliferação de bactérias. Por isso, a escovação antes de dormir é indispensável”, explica o especialista.
E a escova “ideal”?
Nem a mais cara, nem a mais tecnológica: a melhor escova de dentes é aquela com cabeça pequena, cerdas macias ou extramacias, filamentos finos e boa densidade de cerdas. “Escovas duras ou escovação muito agressiva, somadas a cremes dentais abrasivos, podem desgastar o esmalte e agredir a gengiva”, alerta o dentista.
Uma boa aposta são as escovas interdentais do tipo prime. Ele explica que cada dente tem três faces visíveis: a vestibular (parte da frente), a lingual ou palatina (parte de trás) e a oclusal ou incisal (superfície que mastiga ou corta os alimentos). As escovas convencionais alcançam essas áreas sem dificuldade. O problema está nas outras duas faces, mesial e distal, que ficam entre os dentes, onde eles se tocam. Essas regiões costumam não ser acessíveis às escovas comuns.
“É aí que entram as escovas interdentais, que conseguem alcançar esses espaços entre os dentes”, explica Lewgoy. O fio dental também pode ajudar nessa tarefa, embora exija um pouco mais de paciência. O ideal, nesse caso, é usá-lo antes da escovação.
Além disso, Claudio Miyake, presidente do Conselho Federal de Odontologia (CFO), destaca a importância do uso de creme dental fluoretado, com no mínimo 1.100 ppm de flúor, uma vez que esse é um fator comprovadamente eficaz na prevenção da cárie. Também é importante ajustar a quantidade de creme dental conforme a idade (e, pasmem, não é preciso exagerar): de 0 a 3 anos, recomenda-se o equivalente à metade de um grão de arroz; de 3 a 6 anos, a quantidade deve ser igual a um grão de arroz; e, a partir dos 6 anos até a fase adulta, o ideal é o equivalente a um grão de ervilha.
Clareadores e resinas caseiros são arriscados
Nas redes sociais, o que não faltam são opções de produtos e fórmulas ‘mágicas’ para os dentes, especialmente com supostas funções clareadoras. Um exemplo é o uso de resinas dentárias vendidas pela internet, sem qualquer tipo de registro ou autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Em 2025, inclusive, o CFO intensificou ações para combater a venda online desses produtos, que muitas vezes são moldados em casa como se fossem próteses convencionais.
“Essas resinas não têm registro nos órgãos de vigilância sanitária e sua composição é desconhecida. Além do risco de intoxicação e alergias, elas podem causar problemas de oclusão e dor, porque alteram a mordida”, alerta Miyake.
Além das resinas, há outros produtos de uso arriscado, como os aparelhos ortodônticos falsos, piercings e as chamadas ‘joias dentais’, que, se confeccionados com materiais inadequados, podem oxidar e comprometer a saúde bucal. “Também é comum encontrar na internet anúncios de clareadores dentais irregulares e de toxinas botulínicas com preços muito abaixo do mercado, o que é um forte indício de falsificação.”
Creme dental com carvão? Depende
Embora pareça inofensivo por ser mais “natural”, esse produto não é uma solução universal. Segundo Miyake, o uso desse tipo de creme dental é recomendado apenas após procedimentos de clareamento dental realizados por profissionais, sempre sob orientação adequada e com marcas registradas na Anvisa. “As fórmulas caseiras, em especial, devem ser evitadas, pois costumam ser abrasivas, apresentam composição química inadequada e oferecem alto risco de efeitos colaterais tanto para a saúde bucal quanto para a saúde geral.”
Roer unhas e usar palitos de dente? Nem pensar
Alguns hábitos, embora comuns, podem sim render prejuízos à saúde bucal, como por exemplo usar os dentes para abrir garrafas ou embalagens, especialmente quando a força é aplicada sobre ‘coroas’ ou restaurações.
Outro costume que deve ser abandonado é o uso de palitos de madeira para remover restos de alimentos entre os dentes. “Os palitos são feitos para uso culinário, exclusivamente. A limpeza interdental deve ser feita com produtos odontológicos específicos para essa função”, destaca o presidente do CFO.
Lewgoy, por sua vez, explica que esses hábitos podem causar fraturas no esmalte, que é a camada protetora dos dentes, além de danificar a dentina, que fica logo abaixo, e a polpa, o tecido interno rico em vasos sanguíneos e nervos. “Morder tampa de caneta ou gelo também são atitudes que, à primeira vista, parecem inofensivas, mas podem levar a fraturas e até à necessidade de tratamento de canal por conta de processos inflamatórios.”
Alimentação rica em fibras é aliada da saúde dos dentes
Sim, a alimentação tem um papel direto e decisivo na manutenção da saúde dos dentes e gengivas. Segundo Lewgoy, alguns alimentos contribuem para a prevenção de doenças bucais, enquanto outros, especialmente os ricos em açúcar, favorecem o surgimento de cáries, gengivites e até problemas sistêmicos com manifestações na cavidade oral.
O principal vilão é o consumo exagerado de açúcar, em especial a sacarose, altamente fermentável pelas bactérias do biofilme oral. “Ao metabolizarem esse açúcar, essas bactérias produzem ácidos que desmineralizam o esmalte dental, iniciando o processo da cárie”, explica o especialista. Por isso, o consumo frequente de doces, refrigerantes, sucos industrializados e ultraprocessados deve ser evitado ou consumido com moderação.
Por outro lado, uma alimentação rica em fibras naturais, como frutas e vegetais crus, pode ajudar na limpeza mecânica dos dentes durante a mastigação e estimular a produção de saliva. “A saliva é um dos principais mecanismos naturais de proteção da boca: atua como um tampão biológico, neutralizando os ácidos produzidos pelas bactérias e promovendo a remineralização do esmalte”, detalha.
A dentista no Hospital Alemão Oswaldo Cruz, Segundo Sandra Bastos, complementa que laticínios como queijo, leite e iogurte, por serem ricos em cálcio e fósforo, também ajudam a fortalecer o esmalte. Frutas fibrosas como maçã e pera também são boas aliadas, pois estimulam a produção de saliva e ajudam a neutralizar o pH bucal.
O exagero também pode prejudicar
Até os hábitos considerados saudáveis, quando praticados em excesso ou da forma errada, podem acabar causando prejuízos.
“Escovar os dentes com escovas muito duras e com força, por exemplo, pode parecer um ‘cuidado’, mas pode levar ao desgaste do esmalte e à retração gengival”, alerta Miyake. “O uso incorreto do fio dental também pode ser prejudicial, especialmente quando a pessoa faz movimentos bruscos que machucam a gengiva, como se estivesse usando um ‘estilingue’.”
Outro ponto de atenção é o uso indiscriminado de enxaguantes bucais. “Eles não devem ser usados rotineiramente sem a indicação do dentista”, afirma Lewgoy. “Os que contêm álcool, principalmente, merecem cuidado: podem ressecar as mucosas e favorecer o aparecimento de aftas e outras irritações.”