Sensor de baixo custo detecta Parkinson inicial no plasma do sangue
Fabricado em impressora 3D comum, dispositivo desenvolvido por brasileiros pode antecipar o diagnóstico, permitindo o tratamento precoce
Pesquisadores das universidades Estadual de Campinas (Unicamp) e Federal de São Carlos (UFSCar) desenvolveram um sensor eletroquímico que detecta a doença de Parkinson em diferentes estágios. Manufaturado em impressora 3D comum, o dispositivo pode antecipar o diagnóstico, permitindo o tratamento precoce, e ainda funciona como modelo para a identificação de outras doenças, de acordo com artigo publicado na revista Sensors and Actuators B: Chemical.
“O sensor indica rapidamente a concentração da proteína PARK7/DJ-1 no plasma sanguíneo humano e em fluido cerebrospinal sintético. A molécula está relacionada à doença de Parkinson em níveis abaixo de 40 microgramas por litro [40 μg/L]”, explica Cristiane Kalinke, pós-doutoranda no Instituto de Química da Unicamp (IQ-Unicamp), pesquisadora visitante na Universidade Metropolitana de Manchester (Reino Unido) e primeira autora do artigo. “Com a vantagem de poder ser impresso em diversos formatos e tamanhos, inclusive em miniatura, criando dispositivos realmente portáteis, que demandam uma quantidade muito pequena de amostra.”
Para construir o sensor, os pesquisadores utilizaram um filamento comercial composto basicamente por ácido polilático (polímero biodegradável conhecido pela sigla em inglês PLA) associado a um material condutor (grafeno) e outros aditivos. Três eletrodos foram impressos em plástico com tecnologia 3D e passaram por um tratamento químico que os tornou ainda mais condutores e estimulou em suas superfícies a formação de grupos funcionais (carboxílicos), que se ligam com anticorpos. O processo de ativação envolveu remover a superfície polimérica isolante dos eletrodos pela imersão em hidróxido de sódio (NaOH) e a aplicação de um potencial elétrico (positivo e negativo). Em seguida, é promovida a reação específica entre os anticorpos e a proteína PARK7/DJ-1 para fornecer o diagnóstico.
Os passos seguintes do trabalho, que contaram com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), foram imobilizar anticorpos específicos para a PARK7/DJ-1 na superfície dos eletrodos e aplicar o sensor na detecção da proteína em três níveis de concentração: 30 μg/L, 40 μg/L e 100 μg/L. A concentração média em pacientes diagnosticados com Parkinson em diferentes estágios é de aproximadamente 30 ± 9 μg/L, conforme dados da literatura.
“Dificilmente um paciente vai a uma consulta médica em busca de um exame de rotina para detectar Parkinson em estágio inicial – quando há suspeita, provavelmente sintomas físicos e comportamentais já se manifestaram e a doença já está bem estabelecida”, afirma Juliano Alves Bonacin, professor do Departamento de Química Inorgânica do Instituto de Química da Unicamp (IQ-Unicamp) e supervisor do estudo. “Nossa ideia foi construir um dispositivo muito simples e muito barato que permitisse o monitoramento ao longo do tempo e acendesse um alerta para médicos e pacientes no caso de alterações nos níveis da PARK7/DJ-1, o que é especialmente útil se analisado em conjunto com outros biomarcadores.”
Prova de conceito
Um legado importante do estudo é funcionar como prova de conceito ao demonstrar a versatilidade desse tipo de impressão como plataforma para a imobilização de biomoléculas.
“Conseguimos imprimir todos os componentes de uma célula eletroquímica em uma impressora 3D, usando apenas um polímero como material condutor”, afirma Kalinke. “Nesse trabalho específico os materiais eram comerciais, ou seja, foram adquiridos prontos, mas, aos poucos, estamos desenvolvendo novos filamentos para impressão 3D em nosso laboratório também.”
Segundo os autores, a plataforma abre portas para o diagnóstico de outras doenças – no caso da proteína PARK7/DJ-1 especificamente, além de problemas neurológicos, há relação com diabetes tipo 2, infertilidade e alguns tipos de câncer. Mas o objetivo é expandir o uso para outros biomarcadores e, aliás, Kalinke já está trabalhando na fabricação de um sensor para o diagnóstico de febre amarela.
“Imagine que ocorra um surto de determinada doença em uma região específica”, exemplifica Bonacin. “Com poucas impressoras 3D e alguns eletrodos seria possível produzir um sensor como o nosso no local.”
O estudo também contou com a colaboração de Craig E. Banks, professor da Faculdade de Ciência e Engenharia da Universidade Metropolitana de Manchester, do professor Bruno Campos Janegitz e do pesquisador Paulo Roberto de Oliveira, ambos da UFSCar – Campus Araras.