Pesquisadores da Universidade de Ghent e do hospital universitário da instituição, localizada na Bélgica, conseguiram comprovar benefícios de transplante de microbiota das fezes para amenizar sintomas motores e problemas intestinais de pacientes diagnosticados com doença de Parkinson. Em um ensaio clínico que durou um ano, os pesquisadores verificaram melhora após seis meses, um sinal de que a terapia tem potencial para incorporar futuros tratamentos.
O estudo, publicado no periódico eClinicalMedicine, foi realizado com 43 voluntários entre 50 e 65 anos em estágio inicial da doença, dos quais 21 receberam a microbiota e 22 estavam no grupo placebo. Eles receberam amostras de doadores saudáveis de fezes por meio de um tubo que percorreu do nariz até o intestino delgado, onde foi depositado.
Eles foram avaliados três, seis e 12 meses após o procedimento. Os pesquisadores notaram benefícios a partir do sexto mês com dados mais animadores no décimo segundo mês, o que pode indicar que a terapia continua sendo positiva com o passar do tempo. De acordo com o estudo, na avaliação feita um ano depois do transplante de fezes, o escore motor melhorou, em média, 5,8 pontos no grupo de voluntários que receberam as amostras. No placebo, o índice foi de em 2,7 pontos.
“Nossos resultados são realmente encorajadores!”, disse, em comunicado, Arnout Bruggeman , pesquisador e autor do estudo . “Após doze meses, os participantes que receberam o transplante de fezes de doadores saudáveis mostraram uma melhoria significativa na sua pontuação motora, a medida mais importante para os sintomas de Parkinson.”
Por que transplante de fezes?
Investigações científicas apontam que, na fase inicial da doença, ocorre uma aglomeração de proteínas na parede intestinal e elas impactam as células cerebrais porque são levadas do intestino para o cérebro pelo nervo vago.
Pessoas que vivem com Parkinson também têm mais quadros de inflamação intestinal. Estudos recentes também demonstram que os pacientes apresentam alterações no microbioma intestinal, com mais quadros de inflamação no órgão. O grupo da universidade belga constatou que os voluntários que receberam o transplante tiveram menos constipação, um sintoma frequente da doença.
“Nosso próximo passo é obter financiamento para determinar quais bactérias têm uma influência positiva. Isso poderia levar ao desenvolvimento de uma ‘pílula bacteriana’ ou outra terapia direcionada que poderia substituir o transplante de microbiota fecal no futuro”, afirmou, também em comunicado, Debby Laukens, professora da universidade. Novos ensaios serão realizados para verificar se o tratamento em testes teria potencial para retardar a progressão da doença.
A importância do microbioma
O conjunto de trilhões de bactérias presentes no intestino tem despertado o interesse da ciência pela capacidade de equilibrar a saúde geral dos seres humanos e estudos com quadros específicos têm se aprofundado no potencial dos transplantes de fezes para contribuir no tratamento de determinadas condições, como diabetes, esclerose múltipla e asma.
“Antes, o intestino era considerado só um órgão excretor por não se ter um entendimento aprofundado sobre microbiota, mas essas bactérias têm impacto sobre nossa saúde, porque estão ligadas desde a digestão e absorção dos alimentos à produção de hormônios e neurotransmissores”, explica a nutricionista Thais Araújo, autora do livro recém-lançado Enfezado Nunca Mais (Editora Rocco).
Segundo ela, as terapias em uso e em estudo se concentram na separação de cepas específicas dessas bactérias que podem cooperar em patologias para que elas repovoem o intestino dos pacientes.
“A microbiota tem relação nas nossas relações sociais. A disbiose, o desequilíbrio da microbiota, está relacionado com casos de depressão e comportamentos antissociais. Interfere ainda na libido, na pele. O tabu de não falar sobre a saúde intestinal é coisa do passado.”
Doença de Parkinson
Também conhecido como “paralisia agitante”, é um distúrbio progressivo que causa tremores, rigidez e problemas de coordenação motora. Na doença, as células nervosas produtoras de dopamina são destruídas, o que impacta na capacidade do paciente de controlar os próprios movimentos.
A doença neurológica não tem cura e, além de reabilitação, os pacientes são tratados com medicamentos que substituem a dopamina. No entanto, em alguns casos, eles perdem eficácia com o passar do tempo.