O mais amplo levantamento feito até hoje sobre o tema revelou que entre 1973 e 2018 houve um retrocesso de 51,6% na quantidade de espermatozoides por mililitro de sêmen. No primeiro ano analisado, a taxa superava 100 milhões de espermatozoides por mililitro. Passados 45 anos, o total desabou para 49 milhões.
Segundo a pesquisa, isso se passa por fatores ambientais e de estilo de vida, como alimentação e sedentarismo. Indicações de que os tratamentos de câncer e o contato com substâncias presentes em plásticos, como os ftalatos e o bisfenol-A também aparecem, além do uso constante do celular.
O estudo com 2.886 homens jovens sugere que a radiação eletromagnética emitida pelos telefones tem relação com uma menor concentração e contagem total de espermatozoides, o que poderia interferir na fertilidade masculina. O artigo, da Universidade de Genebra (Unige) e do Instituto Suíço de Saúde Tropical e Pública (Swiss- TPH), foi publicado na revista Fertility & Sterility.
A concentração média de espermatozoides foi maior entre os homens que não usavam o telefone mais do que uma vez por semana (56,5 milhões/mL), em comparação com os participantes que faziam o uso mais de 20 vezes por dia (44,5 milhões/mL). Essa diferença corresponde a uma diminuição de 21% na concentração de células sexuais dos usuários mais frequentes.
Segundo valores estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS), um homem provavelmente demorará mais de um ano para conceber um filho se a concentração de espermatozoides for inferior a 15 milhões por mililitro. Contudo, outros fatores também determinam se o esperma tem qualidade, como a motilidade e a morfologia das células sexuais masculinas. Os pesquisadores, porém, não encontraram nenhuma associação entre o uso de telefones celulares e uma piora nesses dois critérios.
Os cientistas basearam seu estudo em dados de suíços com idades entre 18 e 22 anos, recrutados entre 2005 e 2018 em seis centros de alistamento militar. “Os homens preencheram um questionário detalhado sobre seus hábitos e estilo de vida, seu estado de saúde geral e, mais especificamente, a frequência com que usavam seus celulares, bem como onde o colocavam quando não estavam em uso”, explica Serge Nef, professor titular no Departamento de Medicina Genética e Desenvolvimento da Faculdade de Medicina da Unige.
No entanto, o número de pessoas neste corte que afirmaram não carregar o telefone perto do corpo era muito pequeno para tirar uma conclusão robusta sobre o ponto específico. Além disso, como a maioria dos estudos epidemiológicos sobre o tema, a pesquisa é baseada em autorrelatos, uma limitação importante.
“Trata-se de um estudo robusto em um tema bastante atual. No entanto, a metodologia e o desenho do levantamento não nos permite chegar a uma conclusão para embasar uma orientação direcionada”, diz Arie Carneiro, urologista e coordenador da pós-graduação em cirurgia robótica do Hospital Albert Einstein. “A pesquisa levanta uma hipótese, ou seja, gera um alerta na comunidade científica que a utilização em excesso do telefone possa ter correlação com a piora da fertilidade. Mas para adotarmos uma postura rigorosa sobre esta orientação são necessários mais estudos com metodologias mais rígidas”.
Neste ano, a Secretaria Federal do Meio Ambiente da Suíça começou a financiar um estudo que medirá, direta e precisamente, a exposição às ondas eletromagnéticas, especificando o tipo de uso (chamada, navegação, envio de mensagens), e relacionando ao impacto da saúde reprodutiva masculina. Os dados serão coletados por um aplicativo. “No momento, o maior impacto do uso celular tem sido no ponto de vista de qualidade de vida e emocional. Fatores esses que impactam diretamente na saúde das pessoas”, finaliza Carneiro.