A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou nesta segunda-feira, 14, o início dos testes em humanos com uma candidata a vacina inédita contra a hanseníase, doença conhecida no passado como “lepra” e responsável por lesões na pele e nos nervos. Batizado como LepVax, o imunizante será testado em pessoas de 18 a 55 anos que nunca tiveram a doença pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC), ligado à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). O Brasil é o segundo país com mais casos da infecção no mundo — a Índia lidera –.
“O Brasil concentra 90% dos casos de hanseníase das Américas. A cada quatro minutos, é registrado um novo caso de hanseníase no mundo. A OMS já apontou que precisamos de novas ferramentas para controle e as pessoas afetadas pela hanseníase merecem uma vacina”, disse, em comunicado, Verônica Schmitz, líder científica do ensaio clínico da LepVax e chefe substituta do Laboratório de Hanseníase do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz).
Nesta etapa, um ensaio clínico fase 1b, serão incluídos 54 participantes sadios e o objetivo será avaliar segurança, tolerabilidade e imunogenicidade (capacidade de ativar resposta imune). Segundo a Anvisa, eles vão receber doses intramusculares de 2 μg ou 10 μg e serão observados os resultados nos dias 0, 28 e 56.
“A fase pré-clínica e a fase 1a do desenvolvimento clínico foram realizadas nos Estados Unidos e a vacina foi considerada segura e bem tolerada em adultos saudáveis quando administrada por via intramuscular em todas as doses testadas”, informou, em nota, a agência.
Vacina pioneira
De acordo com a Fiocruz, a LepVax é a primeira vacina desenvolvida como foco na bactéria Mycobacterium leprae, causadora da hanseníase. Em camundongos, ela demonstrou ser capaz tanto de prevenir quanto tratar a doença.
“A eliminação sustentada da hanseníase enquanto problema de saúde pública requer uma vacina. Neste cenário, a LepVax surge como uma vacina profilática e terapêutica, que poderá contribuir para as metas de controle da doença”, afirmou, também em comunicado, a chefe do Laboratório de Hanseníase do IOC, Roberta Olmo.
O desenvolvimento desse candidato a imunizante é um esforço coletivo. O projeto teve inicio em 2002 com o financiamento realizado pela entidade filantópica American Leprosy Missions (ALM) e desenvolvimento do Access to Advanced Health Institute (AAHI), ambos dos Estados Unidos. Do Japão, vieram apoio do Global Health Innovative Technology Fund’ (GHIT Fund) e da Fundação de Saúde Sasakawa. E o Brasil teve como patrocinadores o Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz) e o Ministério da Saúde.
Entenda a hanseníase
Doença conhecida há mais de 4 mil anos, a hanseníase é causada pela bactéria Mycobacterium leprae e passa de pessoa a pessoa por meio de tosse, espirro ou fala. A infecção causa lesões manchas brancas, avermelhadas ou acastanhadas na pele, mas elas não são contagiosas. Mesmo assim, causou manifestações de preconceito ao longo dos anos e se tornou um exemplo a não ser seguido diante de doenças infecciosas.
Os pacientes costuma apresentar sensibilidade nas lesões, formigamento nas mãos e pés e nódulos pelo corpo. Também têm comprometimento dos nervos.
O tratamento é ofertado gratuitamente no Sistema Único de Saúde (SUS) e é realizado com a associação de três antimicrobianos (rifampicina, dapsona e clofazimina), terapia denominada Poliquimioterapia Única (PQT-U) com duração de seis meses a um ano, dependendo do tipo de hanseníase.
A hanseníase é uma doença negligenciada e estigmatizada, mas que enfrenta um processo de educação da sociedade para compreensão de que impacta a vida dos pacientes e atinge populações negligenciadas, as que mais precisam de suporte. No Brasil, entre 2014 a 2023, foram registradas quase 245 mil novas infecções, segundo o Ministério da Saúde. No ano passado, foram 22.773 novos casos.