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‘The Chosen’: o fenômeno que prova que o Evangelho é pop

Ao colocar em evidência os seguidores de Jesus, ela se tornou um hit, viralizou num aplicativo gratuito e já é abraçada até pela Netflix

Por Raquel Carneiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 10h44 - Publicado em 4 jun 2023, 08h00

No sermão da Montanha, Jesus proferiu frases que extrapolaram limites religiosos. “Bem-aventurados os que choram, porque eles serão consolados”, diz ele, logo no início. A passagem transcrita nos Evangelhos é recorrente em filmes, séries e novelas cristãs (alô, Record), e encenada sempre de forma imponente, reforçando a aura messiânica e épica de Jesus. Na série The Chosen: os Escolhidos, o caminho é outro. No episódio que abre a terceira e mais recente temporada da produção, Jesus fala enquanto uma música pop com batida de R&B toca ao fundo, dando um ritmo jovial ao sermão. A câmera quase não mira o pregador: ela prefere olhar ao redor, para gente como Pedro, Judas Iscariotes e Maria Madalena. Ao fim, alguns estão extasiados, outros desconfiados, e um sincerão até sugere que a fala foi boa, mas um pouco longa. Jesus, interpretado pelo americano Jonathan Roumie, ri do crítico: em The Chosen, o Messias cristão é sereno, carismático e amigável — estratégia que aproxima o espectador da divindade. Mais acessível ainda são os demais personagens: aqui, os coadjuvantes bíblicos viram protagonistas, refletindo dilemas humanos atemporais — válidos da época de Cristo ao século XXI.

O livro da Bíblia

Os “escolhidos” do título são referência aos que integraram a comitiva de peregrinação de Jesus documentada no Novo Testamento. Para além dos doze discípulos, há outros personagens menos citados nas pregações de igrejas. Caso de várias mulheres, como Maria Madalena, a prostituta acometida por espíritos malignos que se tornou seguidora de Jesus. Aborto espontâneo, doenças incuráveis, dívidas financeiras e lances de violência contra a mulher perpassam o roteiro, em meio a situações cotidianas que vão desde cenas em um bar de apostas até o flerte cômico entre casais. Em um retrato peculiar, o discípulo Mateus, um coletor de impostos, deixa de ser visto como ganancioso para se encaixar no que parece ser um espectro autista — por essa razão, ele sentiria segurança ao seguir regras bem definidas, caso da Lei Romana.

SEGUIDORAS - Maria Madalena na série: ênfase nas mulheres bíblicas
SEGUIDORAS - Maria Madalena na série: ênfase nas mulheres bíblicas (./Divulgação)

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Lançada em 2019, The Chosen está um degrau acima da qualidade sofrível das produções bíblicas recentes — isso, graças a uma produção cuidadosa e um roteiro que foge do óbvio. Mais curioso, porém, foi o modo como desafiou lógicas de mercado. Feita por meio de uma vaquinha virtual que levantou 10 milhões de dólares, a série, gravada no Texas, é transmitida de forma gratuita em um aplicativo que leva o nome do programa, com direito a legendas em diversas línguas, o português incluso. A explosão em audiência — são 390 milhões de espectadores — chamou a atenção das plataformas de streaming: no Brasil, a Netflix e o Globoplay exibem a primeira temporada — lá fora, a série ainda integra o catálogo do Prime Video, da Amazon. Segundo o agregador de conteúdo JustWatch, The Chosen é uma das séries mais vistas entre os brasileiros nos últimos meses — lado a lado com títulos como Succession e Ted Lasso. O lado B da Bíblia também é pop.

Publicado em VEJA de 7 de junho de 2023, edição nº 2844

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