A presidência da Petrobras está, de novo, no alvo de uma tocaia política. Aparentemente, não há motivação pessoal na conspirata.
No Palácio do Planalto e no Congresso, ninguém se queixa do presidente da empresa, Joaquim Silva e Luna, 72 anos, pernambucano, general na reserva e ex-ministro da Defesa no governo Michel Temer. São apenas negócios, sob o manto da campanha eleitoral.
Se tudo sair como previsto até ontem, é possível que Silva e Luna e outros diretores estejam fora do comando da maior empresa do país antes do feriado de 1º de maio.
Como ele já avisou que não se demite, resta a alternativa de uma cerimônia de adeus dentro do manual da legislação das sociedades anônimas. Jair Bolsonaro recebeu um cardápio de alternativas de manobras, a partir de mudanças no Conselho de Administração.
Bolsonaro gastou as últimas três semanas transformando a companhia de petróleo em vilã da campanha eleitoral.
Contou com a ajuda da trilateral do Centrão — o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira; o presidente da Câmara, Arthur Lira; e, o dono do do Partido Liberal, Valdemar Costa Neto.
Por razões diferentes, ganhou a dissimulada solidariedade dos críticos da oposição.
Mudar o presidente e parte da diretoria da Petrobras virou questão eleitoral “estratégica” e de interesse comum. Porque permite a auto-absolvição de todos ,no Planalto e no Congresso, no drama que inferniza a vida dos eleitores, e para a qual os candidatos têm dificuldade de responder objetivamente: por que a gasolina, o diesel, o gás de cozinha e os alimentos estão tão caros e os preços tendem a continuar subindo?
Culpar a Petrobras é saída política conveniente no momento. A empresa teve lucro recorde no ano passado, quando Vladimir Putin ainda planejava sua guerra na Ucrânia. Foi lucro “absurdo”, na qualificação de Bolsonaro e de candidatos presidenciais da oposição. Somou R$ 106 bilhões em transferência aos bolsos dos acionistas.
A maior fatia, R$ 40 bilhões, foram entregues ao governo federal, que controla a empresa (51% do direito a voto). O restante acabou partilhado entre sócios privados, estrangeiros e nacionais — entre esses, gente comum a que, anos atrás, se permitiu aplicar um pedaço do fundo trabalhista (FGTS).
O lucro “absurdo” brotou na esteira da valorização mundial do petróleo. Em dimensão, é comparável ao prejuízo registrado em meados da década, que, quase levou a empresa à lona.
O problema é essencialmente político. O petróleo sobe, derivados e alimentos também, e aumentam a corrosão do poder de compra do eleitorado, já empobrecido por uma inflação (10,2% ao ano) alta e disseminada na economia.
Nas circunstâncias de uma acirrada campanha eleitoral, é adequado apresentar ao público um culpado conveniente para escapar de questões inconvenientes.
Alguns exemplos: por que o país não tem política de estoques estratégicos, reguladores, tanto para combustíveis quanto para alimentos? Por que governo e oposição atravessaram um ano inteiro analisando propostas legislativas para instituir um fundo de amortecimento dos preços dos combustíveis, e até hoje não chegaram a uma conclusão? Por que se gastaram mais de US$ 20 bilhões (R$ 100 bilhões) em projetos inviáveis de refinarias, como a de Pernambuco, ou que nunca saíram do papel, como as do Maranhão, do Ceará e do Rio?
A Petrobras é o maior ativo estatal disponível antes, durante e depois de qualquer eleição presidencial. A crise que está aí foi embalada pela guerra de Putin, mas não sua gênese está além das oscilações recentes nos preços do petróleo e dos derivados.
O motivo real é a longeva disputa pelo controle dos contratos de fornecimento de bens e serviços à companhia — ocasionalmente lucrativa e sob controle do Estado.
A rotina de interferências políticas na gestão tem custado caro à sociedade. Um recente processo em tribunal dos Estados Unidos custou nada menos que R$ 4 bilhões em indenizações a acionistas privados. Eles se sentiram roubados nas maracutaias reveladas pela Lava Jato.