SP: ligação de policiais com PCC acende alerta no Ministério Público
Edição de VEJA mostra como envolvimento de policiais graúdos no assassinato de delator do grupo evidencia infiltração do crime nas forças de segurança

O avanço do crime organizado em São Paulo tem acendido o alerta do governo do estado. Na esteira do assassinato do empresário Vinícius Gritzbach no aeroporto de Guarulhos, em novembro do ano passado, dezenas de pessoas já foram presas por envolvimento no crime, em conexão com a facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital).
A edição de VEJA desta semana mostra como, além do alto número de envolvidos, impressiona o fato de vários deles ocuparem cargos de chefia em setores importantes da segurança pública — dos 26 presos, 22 são policiais, entre civis e militares.
Um exemplo graúdo é o delegado Fábio Baena, que atuava no Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa. Foram detidos também os investigadores Rogério de Almeida Felício, conhecido como Rogerinho, e Eduardo Monteiro, que é sobrinho da Corregedora-Geral da Polícia Civil, Rosemeire Monteiro de Francisco Ibanez (ela pediu afastamento das funções com a repercussão do caso).
A proporção dos desdobramentos do caso pressiona o secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite, a fazer trocas em áreas estratégicas da polícia. Desde janeiro, a “dança das cadeiras” envolveu mudanças no Deic (Departamento de Investigações Criminais), no Denarc (Investigações sobre Entorpecentes), na Corregedoria, no Dipol (Departamento de Inteligência), entre outras áreas.
Delegados tarimbados ouvidos reservadamente por VEJA afirmam que trocas são recorrentes na corporação e que, até o momento, a movimentação não demonstra uma anormalidade na tropa. A simultânea escalada do envolvimento de policiais com o crime organizado, no entanto, levanta preocupações.
O constrangimento da tropa é evidente e há um esforço para tentar separar as chamadas “laranjas podres”. “Aqueles que cometem irregularidades são casos isolados e não representam os mais de 2.600 delegados do estado. Apoiamos que haja uma séria investigação dos possíveis casos, respeitando-se o processo legal”, pondera a presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia de SP (Sindpesp), Jacqueline Valadares.
Para Fernando Capano, advogado e doutor em direito do Estado pela Universidade de São Paulo (USP) e pela Universidad de Salamanca (Espanha), o crime organizado tem aumentado a sua atuação de maneira substancial nos últimos anos, chegando a diversos segmentos da sociedade.
“Neste contexto, me parece clara a tentativa de penetrar em ambientes estatais, preenchendo espaços inclusive no ambiente da política profissional. Provavelmente, em última análise, o objetivo é tornar o Brasil uma espécie de ‘narco-Estado’, à semelhança do que já ocorreu no México e na Colômbia”, diz.
Capano avalia que as trocas realizadas pela Secretaria de Segurança Pública, até o momento, demonstram um esforço do poder público em frear a escalada da criminalidade. “Não se pode culpabilizar ninguém de maneira prévia e açodada, mas faz parte do rol de atribuições da pasta agir com racionalidade e firmeza, reforçando seus quadros e organizando seu efetivo, diante da força que o crime organizado vem adquirindo no Brasil”, diz. “Essa ‘dança das cadeiras’ representa um reforço muito positivo para se debelar qualquer iniciativa de enfraquecimento das nossas instituições por parte das organizações criminosas.”
Ministério Público
A aparente escalada do envolvimento de integrantes da força policial com o crime organizado tem ligado o alerta no Ministério Público. Em reunião do Conselho Superior do MP-SP, em 4 de fevereiro, o conselheiro e procurador da instituição Valter Foletto Santin comentou o avanço das diligências envolvendo o caso do PCC e afirmou que o crime organizado está “tendo a capacidade” de ingressar nos órgãos policiais, o que, segundo ele, “enfraqueceu as instituições”.
O tema voltou a ser comentado na reunião do Órgão Especial do Colégio de Procuradores do MP-SP da última quarta 12. O Procurador-Geral de Justiça, Paulo Sérgio de Oliveira e Costa, afirmou ver com “preocupação” o “controle externo” da atividade policial.
Também na esteira das investigações acerca da atuação de membros da força policial junto a facções criminosas, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) anunciou a criação de um comitê extraordinário reunindo forças de segurança, Ministério Público e Defensoria. No discurso oficial, o objetivo é o de qualificar as políticas públicas para a área de segurança. Nos bastidores, o gesto foi entendido como uma espécie de intervenção de Tarcísio para tentar colocar ordem na casa.
Farão parte do comitê, além de Oliveira e Costa, o secretário da Segurança Pública, Guilherme Derrite; o comandante-geral da Polícia Militar, Cássio Araújo de Freita; o delegado-geral da Polícia Civil, Artur Dian; o controlador geral do estado, Wagner de Campos Rosário; a procuradora-geral, Inês Maria dos Santos Coimbra; e a defensora pública-geral, Luciana Jordão.