Mantenha sua cidade limpa
O ensaísta Davi Lago mostra porque limpeza pública é mais que uma burocracia, é uma virtude cidadã
A proximidade dos pleitos eletivos municipais abre oportunidade única para refletirmos sobre o papel central da zeladoria urbana nas grandes cidades. Estes serviços públicos são direitos estabelecidos pela Constituição de 1988, que defende a manutenção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Ao descentralizar sua regulação aos entes regionais, o texto constitucional abriu possibilidade de se estabelecer mecanismos contextualizados às realidades do cidadão. Assim, os municípios desenvolveram seus próprios procedimentos de zeladoria atentos aos desafios locais.
Há cidades com desafios particulares como, por exemplo, Manaus. Além dos objetivos e práticas gerais da limpeza urbana – como varrição de vias e logradouros públicos, coleta de lixo, lavagem de monumentos públicos, capinação, pintura de guias e meios-fios, limpeza e desobstrução de bueiros – o poder público manauara atua, por exemplo, na limpeza de igarapés e coleta de resíduos em comunidades ribeirinhas. Esses desafios específicos ressaltam a diversidade de características geológicas, climáticas, ambientais de um país continental. A atenção às especificidades de cada município é essencial para elevar a qualidade de vida de sua população e abrir possibilidades de desenvolvimento sustentável. Portanto, além da importância sanitária, a limpeza urbana está vinculada às boas práticas socioeconômicas.
Mas para que esses avanços se concretizem é necessário, antes de tudo, o interesse cidadão, o cultivo dos valores cívicos e democráticos. Limpeza pública não é apenas um direito, mas um dever de todos e todas. A cidade é seu cidadão. É imperativo cultivar a cidade, não a devastar. Por isso, a educação para uma cidadania consciente, solidária, que respeita as pessoas, todas as outras pessoas, assim como o patrimônio coletivo, é indispensável.
Iniciativas inteligentes da comunidade são primordiais. Um excelente exemplo de boa prática é o projeto Revolução do Baldinhos, de Florianópolis, que foi premiado na Semana Internacional Verde em Berlim no ano passado. Desenvolvido desde 2008, o projeto teve o objetivo de conscientizar os habitantes da comunidade Chico Mendes a solucionar um problema grave de contaminação por descarte incorreto de resíduos. A população foi orientada a reciclar restos de comida em compostos orgânicos em baldes especiais. Esses resíduos foram transformados em adubo para o cultivo de hortas pela própria comunidade. A iniciativa laureada mostrou ser possível alcançar os critérios de sustentabilidade da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).
Comunidades brasileiras têm capacidade de desenvolver projetos referência como este. É tarefa contínua de todos nós: valorizar as pessoas dispostas a contribuir, construir uma cidade melhor. A cidade não é nossa inimiga, a cidade somos nós mesmos. Limpeza pública é mais que uma burocracia pública, é uma virtude cidadã.