Prefeitura de Barcelona compra prédio de investidores para combater especulação
É a primeira medida do gênero na cidade em meio à disparada nos preços dos imóveis e uma série de ações para reduzir os aluguéis temporários como pelo Airbnb

Depois de muitos protestos e dias intensos de negociação, a prefeitura de Barcelona anunciou, há uma semana, que comprou de um fundo de investimento privado o edifício residencial Casa Orsola, uma construção modernista próxima ao centro turístico da cidade espanhola que se tornou símbolo da crise imobiliária que afeta a região e diversas outras cidades turísticas mundo afora. A compra, anunciada em 7 de fevereiro pela prefeitura, foi feita em parceira com a instituição sem fins lucrativos Hàbitat 3, voltada ao direito à moradia e com quem serão divididos os custos. O projeto é garantir que os 26 apartamentos do prédio sejam destinados ao aluguel residencial e a preços acessíveis.
É a primeira vez que o governo local faz um movimento do gênero, de comprar um edifício privado, em meio à escalada dos preços dos aluguéis e ao crescimento no número de fundos e investidores comprando imóveis na cidade para usá-los em locações temporárias.
Em junho, o prefeito de Barcelona, o esquerdista Jaume Collboni, já havia anunciado a proibição do aluguel de curta duração das casas da cidade por meio de sites como Airbnb, o que deve ser extinguido gradativamente até 2028. Ele se junta a uma série de países e cidades que vêm restringido a atuação dessas plataformas como Portugal, Nova York, Florença e outras. Em 2023 também entrou em vigor uma lei nacional, a “Ley da Vivienda”, que estabeleceu limites aos aumentos dos alugueis em 140 cidades da Espanha consideradas críticas e criou diretrizes para estimular a oferta de casas populares.
No caso da Casa Orsola, o prédio foi comprado em 2021 pelo Lioness Inversiones, um pequeno fundo de investimentos detido pelo empresário espanhol Alberto Ollé, dono também da companhia de telemarketing Emergia. Alvo de protestos nas ruas e de intervenções de sindicatos de moradores e dos locatários de Barcelona, o fundo era acusado de deixar de renovar os contratos de aluguel conforme venciam. De acordo com a prefeitura, dos 26 apartamentos da edifício, sete estão atualmente sob contratos temporários, cinco têm um contrato de locação padrão e cinco estão sob processo judicial. As outras duas estão vazias.
A resposta do dono
Em uma carta aberta publicada poucos dias antes do anúncio da venda, e divulgada na imprensa espanhola, o agora ex-proprietário da Casa Orsola rompeu o silêncio que vinha mantendo nesses três anos e afirmou que dialogou e renovou os contratos de inquilinos que o procuraram, que ofereceu condições semelhantes a outros que não aceitaram e criticou os que partiram direto para as ações coletivas junto aos sindicatos antes de procurá-lo.
“Depois de ser alvo de todo tipo de insultos e ataques, devo acabar mesmo vendendo o imóvel”, declarou Ollé. “Há três anos a Casa Orsola sofre campanhas de difamação, ocupações ilegais e até atos de vandalismo que danificaram um patrimônio modernista que eu queria preservar. As portas quebradas, as paredes pichadas e as áreas comuns abandonadas não símbolos de justiça social, mas sim da incapacidade de conciliar direitos e deveres.”
O empresário também apontou que alguns dos apartamentos de 60 metros quadrados do prédio estão há sete anos sem reajustes e pagam hoje um aluguel de 700 euros, abaixo do preço de mercado da cidade. O aluguel médio de Barcelona gira atualmente em torno de 1 200 euros, depois de subir mais de 60% na última década.
Propriedades públicas com aluguéis acessíveis
O valor de compra da Casa Orsola fechado na negociação foi de 9,2 milhões de euros, 30% menos do que o preço médio do bairro, de acordo com o comunicado da prefeitura de Barcelona. Disso, 49% será pago pelo governo municipal e 51% pela ONG parceira, a Hàbitat 3. “Essa parceria permite que a compra seja feita com um baixo investimento municipal, retomando os apartamentos para o uso residencial com aluguéis acessíveis”, disse a prefeitura em seu comunicado.
As 26 unidades residenciais da Casa Orsola, conforme sejam liberadas, devem integrar o “Plano Viure” (“plano viver”, em catalão), o programa de construção e oferta de moradias a preços acessíveis lançados pela atual gestão municipal.
A promessa é disponibilizar 3 300 casas detidas pelo poder público ainda no atual mandato, além de outras 5 000 em estágio de execução e uma conta de 10 000 que ainda podem ser construídas nos terrenos disponíveis. Com a limitação ao Airbnb e outros tipos de aluguel de temporada, a prefeitura calcula que a cidade possa retomar para a oferta aos moradores cerca de 10 000 unidades hoje destinadas ao turismo.