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‘A luz atrapalha o repouso, mas é só a cereja do bolo’, diz diretora do Instituto do Sono

Mônica Andersen fala a VEJA sobre as últimas descobertas científicas a respeito dos desafios e dos benefícios das noites bem dormidas

Por Luiz Paulo Souza Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 30 jun 2025, 18h26 - Publicado em 30 jun 2025, 18h00

Não é novidade para ninguém: dormir mal é um dos grandes vilões de um dia feliz. O que a ciência tem mostrado, contudo, é que as consequências da abstinência de sono de qualidade vão muito além do humor, com consequência para a saúde geral e até para a longevidade.

O que as descobertas mais recentes revelam é que os insones são mais doentes de maneira geral — além do maior risco de acidentes, elas tem maior propensão a comer de maneira desregulada e a desenvolver mais doenças crônicas. No Brasil, a biomédica Monica Andersen é uma das maiores autoridades no assunto.

Formada em biomedicina, hoje ela é professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e diretora de pesquisa e ensino do Instituto do Sono. Em entrevista concedida a VEJA, a especialista falou sobre a importância do sono para a saúde, as consequências da falta dele e os principais fatores que interferem nesse processo fisiológico. Abaixo os destaques da conversa.

MONICA ANDERSEN - Biomédica: especialista em sono
MONICA ANDERSEN – Biomédica: especialista em sono (Instituto do Sono/Divulgação)

Por que o sono é importante? O sono ocupa um terço das nossas vidas, sendo a atividade à qual dedicamos mais tempo. Ele é o principal fator que induz o equilíbrio interno e garante que o corpo funcione bem. A falta de sono modifica os nossos receptores cerebrais, aumentando a fome, o apetite e a gula. Essa mesma mudança no cérebro nos torna mais propensos a chorar, a ter oscilações de humor, irritabilidade e impulsividade.

Há alguma área da saúde que seja mais afetada? Não há um órgão mais importante ou mais afetado. Cada pessoa sente a privação de sono de um jeito. Para mim, o ponto de ataque é a garganta, mas para você, é o desânimo. Para outros, pode ser enxaqueca, choro fácil ou irritabilidade.  A privação de sono é o início de uma cascata de consequências negativas. Durante a pandemia, falou-se muito sobre o sistema imunológico e cardiovascular, mas não são os únicos. 

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O cérebro é o orquestrador de todas essas consequências no corpo? De certa forma, sim. Batimentos cardíacos, funções hepáticas e urinárias são gerenciadas pelo cérebro. Quando não dormimos bem, o estômago sofre repercussões, produzindo mais ácido e aumentando a chance de gastrite e úlcera se não houver boa alimentação, isso também passa parcialmente pelo controle cerebral. Cada pessoa paga um preço pela privação de sono, mas não se pode dizer que os danos serão apenas psicológicos.

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A privação de sono tem consequências diferentes a depender da faixa etária? O sono afeta de maneira diferente pessoas de faixas etárias distintas. Crianças, ao contrário de adultos, ficam hiperativas quando privadas de sono. O adulto tende a ficar mais introspectivo e sedentário, o que, junto com as mudanças nos receptores cerebrais, leva ao ganho de peso. O idoso também sofre a privação de sono de outra forma, fragmentando-o, ou seja, acordando e cochilando ao longo do dia. As consequências podem ser similares, mas são prejudiciais em todas as faixas etárias. 

Qual o papel das telas na privação? No congresso Brain, um dos temas fortes foi a exposição a telas. As pessoas se preocupam muito com a luz, mas o importante é a atividade interativa, que acende o cérebro. Em jovens, isso é mais delicado, pois o sistema nervoso central está em amadurecimento e eles têm uma maior tendência a ficar mais horas online. Os algoritmos são inteligentes e criam dependência na atividade interativa da internet. A luz é muito importante porque para iniciar o sono é preciso estar no escuro ou na penumbra, mas ela é apenas um agravante da atividade interativa, que mantém o corpo em alerta. Ela atrapalha, mas é apenas a cereja do bolo. 

Então a questão à noite é a interatividade? Deve-se evitar tudo que é estímulo. Assistir ao noticiário pode ser um estímulo para algumas pessoas, mas não para outras. Brigas à noite são péssimas, assim como brincadeiras muito interativas com as crianças, como pega pega. A leitura costuma ser uma boa escolha, mas para algumas pessoas, a leitura também é excitante. O recomendado é fazer atividades prazerosas, gratificantes e relaxantes para o cérebro. 

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Hoje, qual é o grande vilão? Existe um gráfico que aponta a internet como o grande vilão, mas as demandas profissionais e sociais são tão intensas quanto a internet. O excesso de demandas da sociedade e a resiliência com que os cidadãos as enfrentam são complicadores para a saúde, especialmente para o sono. A sociedade 24×7 é o principal vilão, pois demanda muito de nós. 

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Como equilibrar o sono com o trabalho noturno? Não é possível ajustar o sono dentro de uma rotina de trabalho noturno com a mesma qualidade. Fomos programados para dormir à noite e ficar acordados durante o dia. Quando a sociedade impõe um ritmo 24×7, as pessoas que trabalham à noite pagam com a sua saúde. É cientificamente comprovado que enfermeiras noturnas têm mais câncer de mama do que enfermeiras diurnas, por exemplo, assim como trabalhadores noturnos têm mais problemas cardiovasculares, depressão, obesidade e diabetes. Não nos adaptamos a um sono diurno; fazemos concessões. 

É possível recuperar noites mal dormidas? Não é possível repor o sono perdido. A matemática de dormir 4 horas hoje e ficar na cama até meio-dia amanhã não funciona. Uma única noite sem dormir não o estragará para sempre, o corpo tem adaptações que minimizam isso. Mas um trabalhador por turno certamente paga com sua saúde.

Os medicamentos podem ajudar? Existem muitos medicamentos úteis, sim, mas também existe um exagero de prescrição. A pessoas precisam ir a um médico do sono, que tem habilitação para isso e vai entender qual a melhor abordagem terapêutica. Não necessariamente vai ser um medicamento, muitas vezes as medidas de higiene do sono serão mais adequadas, mas a nossa sociedade tem dificuldade em fazer adequações na rotina. Por isso o abuso de melatonina ou hipnóticos.

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E qual a relação do sono com a longevidade? Quando a gente olha para os idosos mais longevos, com mais de 95 anos e que são saudáveis para a idade, nós vemos que uma característica importante é que elas foram ritmadas. O que os jovens fazem? De segunda a quinta, mantém o ritmo, mas na sexta-feira vão dormir só às 5, 6, 7 da manhã. No domingo a depressão dominical é um sinal de que o ritmo foi rompido e não houve descanso suficiente. Manter a rotina é importante, não só na hora de dormir e acordar, mas nas atividades de todo o dia. Isso ajuda a acertar o ritmo biológico, fazendo o corpo trabalhar melhor.

Quais os outros benefícios de um sono de qualidade? O sono melhora a pele, a disposição, a vontade de interagir e a produtividade. Quem dorme melhor também é mais feliz. As pessoas geralmente perguntam como dormir menos para render mais, e nunca o contrário: como dormir mais e viver melhor. Uma melhor quantidade e qualidade de sono levam a uma vida melhor e de maior produtividade. 

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